Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Isto É Peanurs

A qualidade literária da Eurovisão #2

 

Não sei se é moda mas as músicas ultimamente têm letras cada vez mais profundas. Parece que o Fernando Pessoa teve um ataque de esquizofrenia ainda maior que o normal e juntou os 300 heterónimos ao mesmo tempo para criar letras que saíram sabe-se lá de onde. E se na Eurovisão as tendências musicais são seguidas à risca (por isso é que entre 42 canções há umas 35 que são praticamente iguais), as tendências literárias não lhe ficam atrás.

 

Comecemos pela Austrália (porque é que a Austrália participa na Eurovisão? Ninguém sabe, mas quantas mais músicas medianas, melhor) que envia um rapaz de 17 anos a dizer que já se queimou demasiadas vezes para amar facilmente, daí que com ele o amor não seja fácil nem barato. Vale a pena lembrar que o cantor tem 17 anos e, a menos que seja vampiro e os 17 anos equivalham a 100, não me parece que tenha vivido o suficiente para se "queimar" assim tantas vezes, a menos que isto seja literal e aí começo a preocupar-me com a saúde mental e física do rapaz. 

 

"It don't come easy and it don't come cheap
Been burned too many times to love easily"

 

Avançamos e diz ele que se costumava mover rapidamente para apagar o passado. Não querendo ser óbvia, a menos que ele tenha alzheimer (muito precoce) não apaga nada. Felizmente ele chega a essa conclusão no verso seguinte.

 

"I used to move in fast to erase my past
But it never works, no, it never lasts, no"

 

Passemos para a Bélgica, cuja música andou nas bocas de todos assim que saiu. Eu, que sou hater por excelência daquelas músicas de que todos parecem gostar, nunca consegui ouvir isto até ao fim. Possivelmente porque a voz dela me irrita e dá sono. É isso ou o facto de ela dizer, e cito: "completamente sozinha na zona de perigo, estás pronto/a para agarrar a minha mão?". Amiga, se estás sozinha, quem é que te vai agarrar a mão? Um fantasma? O teu amigo invisível?

 

Por falar em zona de perigo, é possível que nessa zona estivesse a representante do Azerbaijão tendo em conta que toda a música em si tem uma envolvente de perigo e a frase mais repetida é "Have my skeletons". Das duas uma: ou ela coleciona esqueletos, ou tem mais que um o que me parece excelente caso precise de peças suplentes, mas ao mesmo tempo bastante injusto tendo em conta que se eu partir costela não tenho nenhum esqueleto bónus para tratar disso.

 

A Islândia é um dos casos de maior esquizofrenia/estupidez deste ano. Ponto um: ele está debaixo de água a tentar puxá-la. Se alguém nos está puxar para debaixo de água é geralmente contra a nossa vontade a menos que sejamos sereias, certo? Errado. Porque ela procura-o. Sim, ele está a puxá-la para debaixo de água e ela procura-o. Porquê? Não sei, não sou assim tão boa a decifrar códigos. (Notem como não há ponto dois).

 

"You’re under the water
Trying to pull me under
I reach for you
I reach for you"

 

Mas se acham que esta maravilha acaba aqui, preparem-se para esta citação: "fazes-me sentir como papel, cortas mesmo através, estou presa a ti como cola, papel...". Eu sei que isto parece inventado, mas não é. Ora eu já experienciei imensas emoções mas nunca me senti como papel. Aliás, atrevo-me mesmo a dizer que além da Svala (que é a cantora), nunca ninguém se sentiu como papel. Como é que nos sentimos como papel? Assumimos os sentimentos de um papel? E que sentimentos é que um papel pode ter? Confesso que sempre achei que aqueles papéis coloridos tinham outro ar que os brancos não têm e por isso imagino sempre que nesta canção ela se refere a um papel azul ou amarelo, mas nunca a um branco. Poderá uma folha A4 branca ter sentimentos? É a questão que fica no ar.

 

Continuamos numa viagem pelas ilhas e vamos até Chipre (não literalmente) apreciar três minutos de puro barulho (que no fundo é o que isto é) em que se ouve, no meio de uma música de amor, "let me be, be your gravity". Não sei se quem escreveu esta letra tem noção do que é a gravidade mas cá fica "Gravidade é o fenómeno de atração que comanda a movimentação dos objetos. Na Terra, a gravidade é a propriedade que faz com que os corpos se dirijam para o centro da terra", ou seja, a gravidade é o que faz as coisas cair. Portanto ele quer ser aquilo que a faz cair. Que este tipo de romantismo nunca acabe!

 

Ainda nas ilhas temos aquela música de que ninguém se lembra e que eu não faço ideia a que é que soa. A única coisa de que me lembro são dois versos que dizem: "sem fôlego, vou estar a ver-te para sempre, sabendo que há uma vaga no teu coração". Mais uma vez temos aqui amor ao mais alto nível. Para quem não sabe (ou para quem não se lembra como eu não me lembrava até a Elizabete me alertar para isso) o nosso coração está divido em 4 partes e por isso ela está à espera que ele morra para depois ficar com uma vaga que ele tem no coração. Convém é que ele morra depressa que ela já está sem fôlego.

 

Larguemos as ilhas e vamos até à Áustria onde o próprio nome da canção é uma piada. "Running on air". Sim, correr no ar. Porque isso nem se chama voar nem nada. Felizmente também há letras com bom senso no palco da Eurovisão como é o caso da da Macedónia que afirma que "tudo o que preciso para me mexer é o som do meu coração". Isto é tudo verdade, até ganhares artrite.

 

A Alemanha oferece-nos um plágio manhoso de Titanium com uma letra muito interessante: "I've been walking asleep / Dreaming awake (...) / I'm not afraid of making mistakes / Sometimes it's wrong before it's right / That's what you call a perfect life". Para mim perfeito era encontrar agora o bilhete premiado do Euromilhões, mas para ela é ser sonâmbula, sonhar acordada, cometer erros e as coisas correrem-lhe mal e só depois bem. Seem legit.

 

Nuestros hermanos tiveram uma eleição da canção que os representa bastante interessante. Toda a gente queria uma música bastante má chamada "Contigo" mas o júri acabou por dar a vitória a outra igualmente má chamada "Do it for your lover". E, se não conseguiram decorar o nome por ter demasiadas palavras, não se preocupem porque ele é repetido 21 vezes ao longo dos três minutos que dura a música.

  

No meio disto tudo perdeu-me o melhor verso deste ano quando a Grécia decidiu fazem um revamp da sua música chamada "This is love" (dá para perceber como é má só pelo título, não dá?). Onde agora se ouve "This is love, reaching out for the stars" (que também é bastante mau), antes ouvi-se "This is love, rain falls from above". Genial, não é? "Isto é amor, a chuva cai de cima". Custa-me perceber esta mudança.

 

No meio de 42 músicas há muitas cheias de clichés, básicas e desinteressantes (não é o caso destas). Há uma ou outra boazinhas (como é o caso da nossa) e há uma absolutamente genial que, curiosamente, corresponde à minha música preferida e também grande favorita à vitória final. Senhoras e senhoras, uma genialidade chamada "Occidentali's Karma":

 

 

 9, 11 e 13 de março, sintonizem na RTP1 para verem este fantástico espetáculo repleto de músicas assim-assim.

Letras com nota artística #9: "Pica do Sete"

musicas.jpg

 

Já há uns tempos que me ando a questionar sobre esta música e sempre que a oiço penso "tenho de escrever sobre ela" mas, como todas as ideias que tenho, isso acaba esquecido naquele lugar do meu cérebro que armazenou toda a história da arte dada no 12.º ano. Na semana passada estava a ver a gala do Benfica e quem é que aparece para cantar? O António Zambujo. E o que é que ele canta? O Pica do Sete. Foi então que se fez luz. Atentem na letra:

 

 

"De manhã cedinho

Eu salto do ninho e vou p'rá paragem

De bandolete à espera do 7

Mas não p'la viagem

 

Eu bem que não queria

Mas um certo dia vi-o passar

E o meu peito céptico

Por um pica de eléctrico voltou a sonhar

 

A cada repique

Que soa do clique d'aquele alicate

Num modo frenético

O peito céptico toca a rebate

 

Se o trem descarrila

O povo refila e eu fico num sino

Pois um mero trajecto

No meu caso concreto é já o destino

 

Ninguém acredita no estado em que fica o meu coração

Quando o 7 me apanha

Até acho que a senha me salta da mão

Pois na carreira desta vida vã

Mais nada me dá a pica que o pica do 7 me dá

 

Que triste fadário que itinerário tão infeliz

Cruzar meu horário com o de um funcionário de um trem da Carris

Se eu lhe perguntasse se tem livre passe para o peito de alguém

Vá-se lá saber talvez eu lhe oblitere o peito também

 

Ninguém acredita no estado em que fica o meu coração

Quando o 7 me apanha

Até acho que a senha me salta da mão

Pois na carreira desta vida vã

Mais nada me dá a pica que o pica do 7 me dá"

 

Ponto 1: alguém disse ao Zambujo que não há nenhum elétrico com o número 7 em Lisboa? "Ó Jessica mas quem é que te diz que a história da música se passa em Lisboa?". É uma questão pertinente e basta olhar para o videoclip para perceber que este elétrico é, de facto, o 15 e não o 7 (até porque o 7 não existe). Se era para escrever uma música sobre elétricos, escolhia um número entre o 15, 18, 25 ou 28. Outra coisa interessante no vídeo é o tempo que demora o percurso. Notem que ela entra no elétrico "de manhã cedinho", anda um bocado, entretanto é noite e depois volta a ser dia. De facto já cheguei a fazer o percurso completo do 15 e parece demorar um dia inteiro.

 

Mas passemos à letra que é para isso que eu cá estou. Numas festas da terrinha há uns meses estava a dar esta música e eu comentei com a Sara a minha indignação em relação ao facto de não haver um elétrico 7 em Lisboa e foi aí que ela me alertou para outro problema nesta letra. Pensava eu que o rapaz ficava com a pica por causa da rapariga que estava no elétrico. Afinal não. Quem lhe dá pica é o pica ("mais nada me dá a pica que o pica do 7 me dá"). Claro que este verso funciona em termos métricos bastante bem e por isso faz sentido tê-lo na música. O problema é que no resto da música temos mais indícios de que o Zambujo está perdido de amores por um pica da carris, senão atentem nos versos: "E o meu peito céptico/Por um pica de eléctrico voltou a sonhar"  e "Cruzar meu horário com o de um funcionário de um trem da Carris".

 

Seria de esperar que estes fossem os únicos problemas desta letra, certo? Errado. Atentem na primeira estrofe: "De bandolete à espera do 7/Mas não p'la viagem". Calma lá, então ela está na paragem, à espera do elétrico mas não está à espera da viagem? Então está na paragem a fazer o quê? A apreciar a vista? Há muitos miradouros em Lisboa para fazer isso. 

 

(Eu sei que a quantidade de vezes que disse elétrico neste texto é absurda)

Letras com nota artística #8: "Santa Claus Is Coming To Town"

musicas.jpg

 

A pedido de várias famílias (ok, não foram várias famílias, foram umas duas pessoas que me perguntaram porque é que eu deixei de fazer isto) estou de regresso com mais uma letra com nota artística. À semelhança do que fiz no ano passado, vou analisar uma música de natal já que a época assim o exige. “Santa Claus Is Coming To Town”, a música de natal mais assustadora de sempre!

 

 

 

“You'd better watch out, you'd better not cry

You'd better not pout, I'm telling you why

Santa Claus is coming to town

 

He's making a list, he's checking it twice

He's gonna find out who's naughty and nice

Santa Claus is coming to town

 

He sees you when you are sleeping

He knows when you're awake

He knows if you've been bad or good

So be good for goodness' sake”

 

Esta é uma das músicas mais ouvidas todos os natais e é das minhas preferidas mas há que reconhecer que a forma como o pai natal é descrito nesta letra é absolutamente assustadora. O primeiro verso da música avisa-nos logo para termos cuidado. Cuidado? Então mas não é suposto o pai natal ser extremamente simpático e amigo? Andaram a enganar-me uma vida toda. Logo a seguir dizem-nos que é melhor não chorarmos nem fazermos beicinho. Quer isto dizer que o pai natal não se comove com qualquer coisa. Tantos anos de trabalho devem tê-lo tornado insensível.

 

Quadra seguinte e vemos que o pai natal está a fazer uma lista que depois irá rever, não vá ele ter posto alguém que não merece receber presentes na lista. E para fazer esta lista vai descobrir quem se portou mal e bem. Sempre me disseram que quem se porta mal não recebe nada do pai natal mas a verdade é que toda a gente recebe alguma coisa, não é? (Eu cheguei a uma idade em que deixei de receber, mas vamos excluir o meu caso). Além disso medir o comportamento de uma pessoa ao longo de 365 é extremamente difícil para não falar na definição de bem e mal que não pode ser feita por um sujeito que vive na Lapónia e só sai de casa uma vez por ano.

 

Mas o mais preocupante é o que vem a seguir: “He sees you when you are sleeping, he knows when you're awake”. Espera lá, isso quer dizer que o pai natal é omnipresente como Deus ou quer dizer que há câmaras de vigilância escondidas em nossas casas para que ele possa ver tudo o que se passa no conforto do seu sofá? É que se for a segunda opção, então o pai natal é capaz de não ser assim tão simpático como se pensa.

Letras com nota artística #7: "Believe"

 

peanurs.png

 

 

A parvoíce que vos trago hoje não foi ideia minha. Na verdade foi um pedido (sintam-se à vontade para fazer o mesmo), mas é sempre um prazer analisar as belíssimas letras que encontramos na Eurovisão. Vamos então recuar até 2008 e ouvir o vencedor desse mesmo ano: Dima Bilan com "Believe".

 

 

"Even when the thunder and storm begins
I'll be standing strong like a tree in the wind
Nothing's gonna move this mountain
Or change my direction

I'm falling off that sky and I'm all alone
The courage that's inside is gonna break my fall
Nothing's gonna dim my light within

But if I keep going on
It will never be impossible
Not today

'Cause I've got something to believe in
As long as I'm breathing
There is not a limit to what I can dream
'Cause I've got something to believe in
Mission to keep climbing
Nothing else can stop me if I just believe
And I believe in me

Even when the world tries to pull me down
Tell me that I can try to turn me around
I won't let them put my fire out
Without no

But if I keep going on
It will never be impossible
Not today

'Cause I've got something to believe in
As long as I'm breathing
There is not a limit to what I can dream
'Cause I've got something to believe in
Mission to keep climbing
Nothing else can stop me if I just believe
And I believe

I can do it all
Open every door
Turn unthinkable to reality
You'll see I can do it all and more.

Believing
As long as I'm breathing
There is not a limit to what I can dream
'Cause I've got something to believe in
Believing
Mission to keep climbing
Nothing else can stop me if just believe
And I believe me"

 

É possível que isto seja plágio de um dos livros do Gustavo Santos. Acredito que os ensinamentos fundamentais desta canção estão logo no segundo verso: "vou manter-me forte como uma árvore ao vento". Das duas uma: 

  • Ou na Rússia não há dias dignos daquela parte do "The Day After Tomorrow" em que os furações até arrancam prédios;
  • Ou em Portugal as árvores são muito mariquinhas. Vem um rajada a 10 km/h e as árvores já estão todas em cima de casas e de estradas.

 

Felizmente nesse mesmo verso percebemos claramente que a alusão à árvore é uma mera comparação (má, mas é). No verso seguinte o homem afirma-se como sendo uma montanha. Não há cá comparações, é uma afirmação. Mas se ele é uma montanha, porquê comparar-se a uma árvore? E porquê dizer logo de seguida que nada vai alterar a sua direcção? Amigo, se és uma montanha dificilmente tens uma direcção e ainda menos alguém consegue alterá-la.

 

Vamos imaginar que este belo poema é como os Lusíadas onde a continuação de uma frase, se fosse preciso, estava no canto seguinte. Partindo do princípio que o seguimento de "I'm falling off that sky and I'm all alone" é "But if I keep going on" ou que pelo menos as duas estão relacionadas e partindo também do princípio que os ensinamentos do catolicismo estão correctos e o inferno é debaixo da terra, é capaz de ser perigoso ele cair do céu e continuar sem parar.

 

Passemos para o refrão. Atenção: o Dima Biland acredita nele. Óptimo. Sabendo isso vou dormir muito melhor esta noite. Agora há uma coisa que me faz confusão. Não há nada com que ele não consiga sonhar? Nada? Ele que experimente sonhar com uma nova cor. Vá, força nisso!

 

Para terminar, parece-me que há outro ensinamento fundamental nos versos anteriores ao último refrão: o Dima Bilan é uma chave mestra. Não sou eu que estou a inventar. É ele que o diz. Pelo menos é a única explicação lógica que eu encontro para o verso "Open every door". Ora isto assusta-me e, ao mesmo tempo dá-me a esperança de um dia também poder vir a ser uma chave mestra e conseguir abrir a porta de minha casa sempre que me esquecesse da chave. A partir de hoje o meu objectivo de vida é ser simultaneamente uma montanha e uma chave mestra. Como é que eu vou conseguir isso? Epa, é acreditar em mim! 

Letras com nota artística #6: "Last Christmas"

 

 

Já há muito tempo que não me dedico à análise de letras de músicas. Mais por falta de paciência do que outra coisa. Tenho algumas em lista de espera, mas a parvoíce que vão demorar cinco minutos a ler, demora mais que isso a escrever. Sim, ser-se parva dá um trabalhão que não imaginam. Mas vamos então atentar na letra de uma das minhas canções de Natal preferidas: Last Christmas dos Wham!

 

"Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

 

Once bitten and twice shy
I keep my distance
But you still catch my eye.
Tell me, baby,
Do you recognize me?
Well,
It's been a year,
It doesn't surprise me
(Merry Christmas)

I wrapped it up and sent it
With a note saying, "I love you,"
I meant it
Now I know what a fool I've been.
But if you kissed me now
I know you'd fool me again.

 

Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

 

A crowded room,
Friends with tired eyes.
I'm hiding from you
And your soul of ice.
My god I thought you were someone to rely on.
Me? I guess I was a shoulder to cry on.

A face on a lover with a fire in his heart.
A man under cover but you tore me apart, ooh-hoo.
Now I've found a real love, you'll never fool me again.

 

Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

Last Christmas

I gave you my heart

But the very next day you gave it away.
This year
To save me from tears
I'll give it to someone special.

 

A face on a lover with a fire in his heart (I gave you my heart)
A man under cover but you tore him apart
Maybe next year I'll give it to someone
I'll give it to someone special.

Special...
Someone..."

 

 A meu ver, há três maneiras de interpretar esta música e, por isso mesmo, vou focar-me apenas no refrão da mesma caso contrário era Natal e eu ainda estava a esmiuçar isto.

 

1. A óbvia. É a maneira como toda a gente interpreta a música: um desgosto amoroso. Logo nesta interpretação menos trabalhada vemos a estupidez que é esta letra. Portanto falamos de um indivíduo cujo amor foi rejeitado pela pessoa a quem "ofereceu" o seu coração. Até aqui tudo bem. Mas há uma solução para que o coração "oferecido" não fosse devolvido no dia seguinte: não enviar o talão de devolução/troca. O problema é quando o indivíduo diz que este ano vai "oferecer" o seu coração a alguém especial. Daqui deduzimos uma de duas coisas:

  • Que o indivíduo no Natal passado "ofereceu" o seu coração a alguém que não era especial e portanto é estúpido;
  • Que o indivíduo achava que estava a "oferecer" o seu coração a alguém especial no ano passado que depois provou que não o era e portanto é estúpido por achar que este ano consegue perceber exactamente quem é e quem não é especial.

2. A literal. É a que me vem de imeadiato à cabeça cada vez que oiço esta música. Se o indivíduo ofereceu o seu coração no ano passado, como é que o vai oferecer novamente este ano? Não é suposto uma pessoa falecer sem coração? Além disso, quem é que quer receber um órgão no Natal? Antes uma meias.

 

3. A verdadeira. Esta música fala de tráfico de órgãos (ou numa versão mais soft de transplantes), senão vejamos: um indivíduo precisa de um coração novo para viver e eis que o indivíduo da canção lhe oferece o dele (claro que primeiro tem de falecer). Transplantes de coração devem ser complicados e, portanto, no dia seguinte, o indivíduo que recebeu o coração rejeitou-o. Assim sendo, esse mesmo coração fica numa qualquer câmara frigorífica para que no ano seguinte possa ser doado a outra pessoa. Parece-me óbvio. 

Letras com nota artística #5: "Às vezes"


Há uns dias na rádio estava a dar esta música da banda do Bernardo Silva. Ouvi o primeiro refrão, mudei para a RFM e (supresa!) estava a dar kizomba. É fácil perceber que nem uma coisa nem outra faz propriamente o meu género musical. Acabei a ouvir o relato do Porto na Antena 1 e não duvido que foi a minha melhor escolha. Mas, uma vez que tive o prazer de ouvir alguns versos de "Às vezes", pareceu-me uma boa aposta para esta rubrica (e para os fãs da banda me odiarem). 

Qual não foi o meu espanto quando vi este "oficial lyric video". Antes de passar para o conteúdo, atentem na letra que nos é apresentada no vídeo do canal oficial da banda. Vejam o vídeo (sim, pode ser sem som) e contem os erros comigo (os repetidos também contam).


"Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Sei que às vezes eu não estou do teu lado (ok)
E não te ligo por estar muito ocupado (tá bem)
Tu não mereces eu deixar-te nesse estado (eu sei)
Desculpa não ser esse príncipe encantado
Quando não respondo, não sei porque é que me escondes, sabes

Que sou teu, mas queres um romance apertado
As vezes é um sufoco, outras vezes fico louco e dizes
"Não tens razão pra te sentires enganado"
Eu sei que me contas coisas que não contas a mais ninguém
E perguntamos ao tempo quanto tempo o tempo tem
Passam, horas, dias, choras, sei que está tudo errado dizes

Não vás embora, fica, mais um bocado
Eu fico sempre por perto por mais voltas que dês
Tu sabes, que eu não me apego, depois vens com porquês
Imaginas essas histórias tipo "era uma vez"
Baby, eu sou a folha em branco dos romances que lês

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

shhh eu não digo a ninguém
que me queres e preferes aos outros que tu tens
Eu sei, que é difícil quando o clima é propício
Controlares esse teu vicio que tens por mim desde o início, ok
Eu quero e faço por isso e tu queres um compromisso
E eu sou mais de improviso e tu só queres ficar bem
E ficas doida comigo porque tens noção do perigo
Mas eu não sei se consigo dar-te tudo o que tenho
Sabes que te quero embora seja às vezes
Tento ser sincero, só que, tu não me entendes
Não tenho culpa, mas não sinto o que tu sentes
Hoje ficas cá em casa, uma vez não são vezes

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Oh e eu não digo a ninguém
Eu sei

Sobe, que eu não digo a ninguém
Cora, que eu não digo a ninguém
Fica, que eu não digo a ninguém
Podes fazer o que quiseres que eu não digo a ninguém.

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem

Ás vezes não sei o que queres e digo ok
Ás vezes não sei o que faço e tu ta bem
Ás vezes fazes de propósito, eu sei
Uma vez não são vezes e eu não digo a ninguem"

Se as contas não me falham, há 43 erros de português neste vídeo, e a letra nem está completa. Eu a fazer ditados no primeiro ano dava menos erros que a pessoa que escreveu isto. Camões neste momento está às voltas no caixão. Ou ás voltas, como diriam os Dama. 

Mas passemos ao conteúdo. 

"Às vezes não sei o que queres e digo ok". É uma táctica genial. Eu própria uso e abuso dela. Desta e do aceno de cabeça sempre que não percebo o que me disseram. Claro que as pessoas que já me conhecem bem sabem sempre quando é que eu não percebi. 

"Uma vez não são vezes". Sai um prémio para o autor da letra. Podia jurar que vezes e vez são a mesma coisa. Porque "uma" nem pressupõe o uso do singular e "vezes" não é plural. Depois da descoberta do Galileu de que era a Terra que girava à volta do sol (ou á volta), parece-me que esta é a maior descoberta da Humanidade.

"Tu não mereces eu deixar-te nesse estado". Foi o Jesus que escreveu este verso? (ou, neste caso, a letra toda).

Com tanta letra (a maioria num português com um acordo ortográfico diferente do que toda a gente usa) é difícil perceber sobre o que é a música. Então isto é sobre um rapaz que nunca tem tempo para a namorada ou é a namorada que o anda a enganar? Isto é quase tão complexo como aquele poema do Álvaro de Campos sobre as máquinas que ouvimos nas aulas de português com a voz do Mark Landers do Oliver e Benji. E o que é que ele não diz a ninguém (ou ninguem) afinal? 

Tenho demasiadas perguntas sobre este tema e sobre a banda em si. A maior de todas será mesmo, como é que estes três (sendo que um deles canta especialmente mal) conseguiram chegar ao patamar em que estão na música portuguesa? Não respondam. Das últimas vezes que ouvi rádio, percebi perfeitamente. 

Letras com nota artística #4: "Aphrodisiac"



Mais uma vez uma música desconhecida da generalidade das pessoas e mais uma vez a pedido. "Aphrodisiac" é o tema que a Grécia enviou à Eurovisão em 2012. A Grécia é aquele tipo de país que envia uma genialidade num ano e o típico eurotrash no seguinte. Mas vamos ao que interessa. "Aphrodisiac" é uma canção de Eleftheria Eleftheriou. Acham que o nome soa mal? Deviam ouvir a voz dela.

Concentrem-se neste belo tema que deu um dos piores resultados à Grécia no ESC deste século:


Agora concentrem-se na letra que eu vou fazer o mesmo:

"I gotta to say what’s on my mind
When I’m with you I feel alright
You call me baby, we spend the night
I’m so addicted, I feel alive

Over and over I’m falling

Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me dance, dance like a maniac
Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me want your aphrodisiac

You make me want your aphrodisiac

I think about you all the time
I just can’t get you off my mind
You drive me crazy, you drive me wild
You’re so addictive, there’s no way out

Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me dance, dance like a maniac
Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me want your aphrodisiac

You make me want your aphrodisiac

I’m craving for your touch
I want it way too much
I’m craving for your touch
Too much, your touch, too much

Over and over I’m falling

Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me dance, dance like a maniac
Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me want your aphrodisiac

Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me dance, dance like a maniac
Oh oh oh oh oh, oh oh oh oh oh
You make me want your aphrodisiac

You make me want your aphrodisiac"

A pergunta que se impõe é: o que é  então o afrodisíaco?

A rapariga começa a canção a dizer que tem de dizer o que está a pensar. É uma coisa que eu não aconselho a ninguém porque suponho que toda a gente pense da mesma forma estúpida que eu. Eu raramente digo aquilo que penso e ainda mais raramente penso no que digo. Mas parece que ela só pensa que quando está com seja lá quem for se sente bem. Confesso que estava à espera de uns pensamentos mais elaborados, mas enfim.

"You call me baby, we spent the night" - é de mim ou ela é um bocadinho (mas só um bocadinho mesmo) oferecida? Espero que ela nunca vá a um concerto da Britney Spears em que ela cante o "Baby one more time" a olhar para ela. 

"I'm so addicted, I feel alive" - querida, se fores viciada em droga ou álcool, é normal que te sintas viva. A menos que sejas como algumas pessoas que eu conheço que "morrem" com o efeito álcool. À medida que avançamos na letra desta bela melodia percebemos que ela cai uma e outra vez. Rapariga, é possível que isso seja por te sentires "viva". E ainda dança que nem uma maníaca. Isso já tinha reparado.

Chegados à segunda parte da música, temos quatro versos para dizer uma coisa que já foi dita antes. Lembram-se do primeiro verso? Se não se lembram vão lá atrás ver que eu espero. Já se lembram? Lembram-se de eu questionar o que é que ela poderia estar a pensar? Temos aqui a resposta. Está a pensar, SEMPRE, na pessoa a quem dirige a música. E porquê? Porque essa pessoa é viciante. 

Desconfio que a música não se refira a alguém, mas sim a alguma coisa. Faz muito mais sentido. Pensem comigo: 
  • uma coisa viciante;
  • uma coisa que é difícil abandonar;
  • uma coisa que a faz dançar como uma maníaca;
  • uma coisa que a deixa maluca;
  • uma coisa que a faz sentir bem;
  • uma coisa que a faz cair uma e outra vez.
Isto é uma pessoa? Para mim não, mas isto sou eu, que gosto de acreditar que as letras das músicas têm alguma coisa interessante por baixo de tanta falta de conteúdo. Isto podia perfeitamente ser o hino dos AA. 

Letras com nota artística #3: Dunas

Depois de duas análises de duas letras diferentes [aqui] e [aqui], parece-me a altura ideal para apostar na análise de uma música conhecida de todos. Falo daquela que é a primeira música que toda a gente aprendeu a tocar na viola (toda a gente menos eu que para ler uma pauta preciso de um dia inteiro): as Dunas, dos GNR.

Na verdade apercebi-me do quão ridicula é a letra ontem quando fui ver o concerto da banda ao Bodo. Atentem então na letra de "Dunas":


"Dunas, são como divãs,
Biombos indiscretos de alcatrão sujo
Rasgados por cactos e hortelãs,
Deitados nas Dunas, alheios a tudo,
Olhos penetrantes,
Pensamentos lavados.

Bebemos dos lábios, refrescos gelados (refrão)
Selamos segredos,
Saltamos rochedos,
Em câmara lenta como na TV,
Palavras a mais na idade dos "PORQUÊ"

Dunas, como que são divãs
Quem nos visse deitados de cabelos molhados bastante enrolados
Sacos camas salgados,
Nas Dunas, roendo maçãs
A ver garrafas de óleo boiando vazias nas ondas da manhã

Bebemos dos lábios, refrescos gelados,
nas dunas!
Em camara lenta como na TV,
Nas dunas..
Nas dunas..
Naasss duunas...
Naasss duunas..
Refrescos gelados...
Como na Tv.
Nas duunas.."

Importa antes de mais nada apresentar algumas definições que me parecem relevantes para uma análise cuidada deste belo poema. Todas as definições são do priberam, que eu não ando aqui a inventar nada.

Dunas: monte de areia acumulada pelo vento à beira-mar.


Divãs: espécie de sofá; colecção de poesias árabes; conselho de Estado (na Turquia); sala onde o divã funciona. (vamos acreditar que se referem ao sofá que de poesias árabes e conselhos de estado turcos não sou uma pessoa tão entendida).


Numa abordagem menos realista, até consigo entender que as dunas sejam como divãs. Principalmente na altura em que a música foi lançada. Lembram-se? Quando havia realmente dunas? Quando não era preciso levar areia para a praia? Ah, que saudades desses tempos! Com o primeiro verso tudo bem, certo?

Mas então de onde raios vêm os biombos? Mas isto não são uns biombos quaisquer (ou quaisqueres, que de vez em quando uns pontapés na língua portuguesa também ficam bem na blogosfera) são "biombos indiscretos de alcatrão sujo rasgados por cactos e hortelãs". Este dois versos davam para analisar durante mais tempo que os dez cantos dos Lusíadas. 
  • Ponto 1: claro que os biombos são indiscretos. São coisas (a meu ver inúteis) enormes que ocupam imenso espaço. Para serem discretos precisavam do manto da invisibilidade e é possível que o manto fosse pequeno demais para os tapar.
  • Ponto 2: se os biombos são de "alcatrão sujo", como é que podiam ser discretos? 
    • Ponto 2.1: onde é que se arranjam biombos de alcatrão? É que eu estou a pensar ligar ao Gustavo Santos para me vir mudar a casa e gostava de ter um biombo de alcatrão, mas do lavado.
  • Ponto 3: os cactos rasgam alcatrão? Brilhante. E a hortelã? Rasga alguma coisa?
Passemos à frente. Eu costumo beber de copos ou garrafas. Eles bebem dos lábios. A menos que sejam os lábios da Manuela Moura Guedes, são capazes de ficar com sede. Depois de se refrescarem, gelarem e selarem segredos vão praticar parkour, mas nos rochedos, que não é tão perigoso. Fazem isto tudo em câmara lenta, como na TV. É certo que eu não via a televisão desta altura, mas era assim tudo tão vagaroso? É que agora é ao contrário. É sempre a despachar, a menos que o Paulo Bento esteja a falar. Aí precisamos de meia hora para ouvir uma frase.

Para terminar, se alguém me conseguir dizer o que é a "idade dos porquê", ganha uma conjunto de maquilhagem e cremes. (Ok, não ganha nada, mas estou a adaptar-me à blogosfera e parece que isto faz parte).


Conclusões: as letras dos GNR (que ontem apercebi-me que são todas dentro deste género) são frases soltas (ou mesmo palavras). É mais ou menos o que o Reininho faz quando fala. Diz umas palavras. Às vezes forma uma frase, outras tem menos sorte (e eu faço parte do grupo de pessoas que adora o homem). As letras dos GNR são mais ou menos como os poemas do Fernando Pessoa, a diferença é que rimam.

Se se lembrarem de letras deste nível, avisem. É possível que isto seja a minha vocação.

Os "fãs" pedem... e eu faço

Rita Pereira (uma rapariga com o mesmo nome da actriz, mas bastante mais talentosa que ela), possivelmente a única pessoa que se ri das minhas piadas porque não convive diariamente comigo, pediu-me que analisasse a letra da música (?) "Girl From Sweden" do cantor (?) sueco Eric Saade. Eric Saade é "conhecido" do público pela participação no Festival Eurovisão da Canção 2011 onde alcançou o 3.º lugar com uma música cujo refrão era o seguinte:

"I will be popular
I will be popular
I'm gonna get there
Popular.

My body wants you girl
My body wants you girl
I'll get you when I'm popular"

Ah! Até me revigora a alma tanta profundidade. Este ano regressou ao Festival da Canção sueco (que é bastante mais interessante que o português), com "Sting", uma bela canção (?) com versos como "It's gonna sting so bad, it's gonna drive you mad" e "I knew you before you were a cool kid, so screw you". Agora que já perceberam que a qualidade literária reina para estes lados, apresento-vos "Girl From Sweden": 

allowfullscreen>